LEOPOLDINA: A IMPERATRIZ CIENTISTA

CANAL APAIXONADOS POR HISTÓRIA
9 min readOct 21, 2020

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(Foto edição pertencente ao Canal Apaixonados por História — Professora Sabrina Ribeiro, para usá-la dê os créditos.)

A pequena arquiduquesa austríaca Leopoldina era uma princesa diferente das outras, foi descrita como uma criança excepcional e estava mais interessada em atividades intelectuais do que com sua aparência externa.

Dona Leopoldina, suas irmãs e irmãos foram submetidos a um programa intensivo de estudos, tudo isso acompanhado de perto por sua mãe, a imperatriz Maria Teresa de Nápoles e Sicília que fazia questão de ter os melhores professores da Europa para ensinar seus filhos matérias fundamentais.

Imperatriz Maria Teresa de Nápoles e Sicília e seus filhos, a pequena Leopoldina em um vestido marrom. (Miniatura Biblioteca Nacional Austríaca) (Foto edição pertencente ao Canal Apaixonados por História — Professora Sabrina Ribeiro, para usá-la dê os créditos.)

As crianças estudaram disciplinas como história, geografia, matemática, música, desenho, literatura e idiomas como francês, italiano, inglês e latim, além do alemão é claro.

O Imperador Francisco I, pai de Leopoldina era apaixonado por ciências naturais, botânica e jardinagem, paixão que lhe rendeu alcunha de “Imperador das Flores” e “Imperador Floricultor”, em alemão: “Blumenkaiser” e “Obstbaukaiser”. Francisco I fez questão de transmitir seu hobbie a seus filhos.

Além disso o monarca era um grande colecionista, Francisco deixou uma coleção com mais de quatro milhões de folhas e flores secas guardadas, com esse acervo fundou em 1807 o gabinete da corte botânica, que deu origem ao departamento de botânica do Museu de História Natural.

Retrato da infância de Leopoldina, em 1807, por Vinzenz Georg Kininger (Museu Nacional Húngaro) Gravura descoberta durante as pesquisas da professora Sabrina Ribeiro.

Por influência do pai, a pequena arquiduquesa começou a se interessar por ciências naturais, botânica, física, mineralogia, geologia e astronomia. Entretanto Leopoldina levou algumas broncas de sua irmã mais velha, Maria Luísa, por conta de sua preguiça e teimosia. Ela sempre demonstrou mais interesse por disciplinas como botânica e mineralogia. E assim como seu pai, desenvolveu o hobby de colecionar plantas, minerais, flores e conchas.

Anotações em um antigo livro sobre um molusco, datado 1821, podemos observar o nome da arquiduquesa austríaca no canto direito superior, foto de S. Schnedl, (Museu de História Natural de Viena) Documento descoberto durante as pesquisas da professora Sabrina Ribeiro.

Aos 13 anos, Leopoldina teve a oportunidade de visitar a Universidade de Praga, a arquiduquesa ficou fascinada pela parte dedica à mineralogia e registrou:

“Fomos para o gabinete dos minerais, que contém exemplares raros e mais de 51 vitrines. Eu poderia passar o dia inteiro lá dentro sem comer nada; desde que estive em Praga aumentei minha coleção com algumas pedras e exemplares lindos.”

Os Habsburgo-Lorena em sua maioria eram fascinados pela natureza, a prova disso são as criações de jardins e estufas em volta do palácio. Em uma carta direcionada a sua irmã preferida Maria Luísa, Leopoldina contou sobre uma passagem no Castelo de Laxenburg:

“Empenho-me bastante para passear, principalmente em meu jardim, meu predileto, cheio de frutas, em particular maçãs, peras, um abrunho amarelo, e ameixeiras, uma cerejeira, vinte e quatro pessegueiros, doze parreiras, quatro ginjeiras, e dois damasqueiros, depois muitas árvores exóticas e plantas perenes, além disso há canteiros com brotos […] e frutas silvestres.”

Schloss Laxenburg Franzensburg, foto de Thomas Ledl

Maria-Luísa sabia da paixão de sua irmã pela natureza e fazia questão de enviar flores e mudas de diversos lugares do planeta para Leopoldina, que ficava maravilhada com os presentes naturais.

✎ Atenção: Você está autorizado a compartilhar o texto ou parte dele, desde que cite a fonte dessa forma: Texto publicado pela Professora Sabrina Ribeiro no Canal Apaixonados por História. Disponível em: (Cole o link do texto ou do vídeo aqui)

Em uma das residências da família Habsburgo-Lorena, o conhecido palácio de Schonbrunn existe até hoje um imenso jardim com flores e árvores de várias espécies, uma estufa e um zoológico criado em 1752, nesse lugar Leopoldina passava o verão junto a seus irmãos explorando os jardins e observando os animais.

Se você quiser saber mais sobre esse magnífico palácio, assista o vídeo:

Canal Apaixonados por História

Em 1816, sua irmã mais nova Maria Clementina se casou e Leopoldina que era apenas um ano mais velha ficou preocupada com a possibilidade de ficar solteira para sempre. Em uma carta desabafou com sua irmã Maria Luísa:

“Ontem o querido papai me confortou com a promessa de me nomear a mineralogista da corte, caso eu fique em casa.”

Mal sabia Leopoldina que 1 ano depois estaria casada com um príncipe português. Durante as tratativas do casamento entre Dom Pedro e Dona Leopoldina, a arquiduquesa perguntou ao embaixador português, Marquês de Marialva se o pretendente gostava de mineralogia e Marialva mentiu, a fim de agradar a arquiduquesa disse que sim, que Pedro também gostava mineralogia e botânica.

Em 14 de fevereiro de 1817 princesa escreveu a sua irmã:

“O Brasil! Você sabe que eu sempre tive uma queda pelo Novo Mundo e já dizia quando criança que lá eu queria ir um dia! Em meus estudos de História natural farei ótimos progressos, pois garantem-me que no Brasil há minerais em enorme quantidade e variedade. Assim poderei agora estudar com todo afinco. Disseram-me também que o Príncipe é muito culto e cheio de interesse por todas as ciências.”

Imperatriz Maria Leopoldina da Áustria

Leopoldina se casou com Dom Pedro por procuração em 13 de maio de 1817, mas só se veriam pela primeira vez em 5 de novembro de 1817. Após a cerimônia de casamento os embaixadores portugueses Navarro de Andrade e Marialva foram desejar felicitações a princesa. Encontraram Maria Leopoldina “rodeada de mapas do Brasil e de livros que contavam a História do Reino, ou Memórias a ele relativas.”

Depois do casamento por procuração, o Imperador Francisco, a fim de agradar a filha que amava ciências naturais e estreitar os laços entre Portugal e Áustria projetou junto ao príncipe de Metternich a Missão Austríaca ao Brasil, uma expedição formada por diversos cientistas que tinham como objetivo adentrar pelo interior do Brasil estudar os animais, a sociedade, as paisagens, as riquezas naturais, a fauna e a flora brasileira. Os europeus eram proibidos de explorar a colônia portuguesa, com o casamento entre Pedro e Leopoldina, os germânicos viram uma ótima oportunidade de conhecer e explorar a fascinante natureza tropical.

✎ Atenção: Você está autorizado a compartilhar o texto ou parte dele, desde que cite a fonte dessa forma: Texto publicado pela Professora Sabrina Ribeiro no Canal Apaixonados por História. Disponível em: (Cole o link do texto ou do vídeo aqui)

A austríaca que era apaixonada por ciências naturais, ficou animada em conhecer o Brasil. A futura imperatriz não trouxe consigo um navio abarrotado de roupas e modistas, mas sim sua coleção de minerais e uma expedição de cientistas. Durante a travessia do atlântico, em uma parada na ilha da madeira ela coletou plantas e flores, como podemos ver nessa tela.

Dona Leopoldina colhendo amostras de flores, durante uma parada na Ilha da Madeira em 1817.

Após o desembarque no reino tropical, Dona Leopoldina teve que cumprir seu papel de princesa e seguir os protocolos da corte portuguesa, entretanto a princesa auxiliou o trabalho da Missão Austríaca, participando de coletas de plantas, empalhando animais e organizando os materiais antes de serem enviados a Europa. Sabemos que Leopoldina sabia preparar peles de animais e era uma grande taxidermista. A taxidermia é o feito de montar ou reproduzir animais para exibição ou estudo. Essa ciência envolve conhecimentos de diversas áreas além da biologia, como: química, anatomia, ecologia e artes plásticas.

Sala das aves no Museu de História Natural de Viena, foto de Nevinho

Quando a Princesa chegou ao Brasil, foi presenteada por seu sogro, o Rei Dom João VI, com uma caixa de ouro cheira de diamantes lapidados. Entregando o presente Dom João disse:

Em 1818, um ano após a chegada de Dona Leopoldina, foi criado o gabinete de botânica na Quinta da Boa Vista e recriado o Museu Real, todos por influência da princesa.

A Imperatriz cientista enviava amostras de plantas, sementes, animais empalhados e minerais a Europa, mas exigia que tudo fosse coletado em dobro, para que um exemplar ficasse no Brasil também. Através desses materiais enviados por Leopoldina, os cientistas puderam estudar mais sobre a natureza desconhecida do Novo Mundo. Em troca Leopoldina negociava com os cientistas outras espécies de plantas e minerais que eram enviados para o Brasil.

Sala de anfíbios no Museu de História Natural de Viena, foto de Nevinho

O resultado do trabalho de todos esses cientistas foi a publicação de diversos livros sobre a fauna e flora brasileira, com muitos itens enviados para o “Brasilianeum” Museu Brasileiro de Viena, criado pelo Imperador Francisco I.

Uma das atividades preferidas de Leopoldina era cavalgar pelas matas nas redondezas da cidade do Rio de Janeiro, especialmente pela floresta da Tijuca, atividade que fazia duas vezes ao dia, a primeira oito horas da manhã e a segunda quatro horas da tarde acompanhada de seu marido, o Imperador Dom Pedro I. A princesa não se importava em cavalgar vestida com camisas e calças largas, além de um chapelão. Ela ia preparada, caso encontrasse alguma planta ou animal exótico para coletá-lo.

Dona Leopoldina em um passeio a cavalo, por Charles Landseer (Coleção Brasiliana Iconográfica)

No final de 1824, D. Leopoldina saiu pela manhã sozinha e se perdeu em uma floresta, em carta registrou o ocorrido:

“Numa linda manhã me perdi na floresta, onde me arranhei toda nos espinhos das mimosas, nas folhas cortantes dos juncos e nas raízes das árvores e plantas […] e quase cai trinta vezes […]. Além disso estava acompanhada, não pelo canto encantador do gracioso rouxinol, mas pelo rugido das onças, porcos-espinhos e pelo grunhido dos grandes macacos berradores barbados […]

Em 1819 Dona Leopoldina com então 22 anos conheceu José Bonifácio de Andrada e Silva, o nobre senhor de 56 anos tinha acabado de voltar da Europa para sua terra natal. Apesar de no Brasil José Bonifácio ser mais conhecido por sua atuação política, na Europa ele era conhecido por seus profundos conhecimentos em mineralogia e geologia.

José Bonifácio de Andrada e Silva, Retrato de Benedito Calixto

Em 1790 José Bonifácio realizou uma excursão científica pela Europa, afim de aprimorar seus conhecimentos sobre mineralogia, filosofia e história natural. Durante a viagem ele fez a descrição física e química de 4 novos minerais nunca estudados e 8 já conhecidos, tornando-o descobridor da petalita, espodumênio, criolita e escapolita.

Sabemos que naquela época, na corte José Bonifácio era uma das únicas pessoas, se não o único que sabia falar alemão fluentemente, isso fez que a jovem princesa e o ancião desenvolvessem uma amizade sincera. Além disso compartilhavam o interesse por botânica e mineralogia.

Durante os 9 anos que a Imperatriz cientista viveu no Brasil ela se dedicou ao estudo da natureza brasileira, ao processo de independência do Brasil e é claro aos seus filhos.

Quando a Imperatriz Leopoldina faleceu em 1826 deixou um acervo imenso de plantas, minerais e cadernetas com suas anotações e estudos, tal acervo serviu de base para a criação do Museu Nacional do Rio de Janeiro.

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FONTES & LIVROS:

Sua majestade como jardineiro, matéria de Christian Hlavac. Wiener Zeitung. Disponível em: https://www.wienerzeitung.at/nachrichten/wissen/946175_Seine-Majestaet-als-Gaertner.html

O Imperador das Flores, matéria de Katharina Ziegler. Fórum Áustria. Disponível em: https://austria-forum.org/af/Wissenssammlungen/Essays/Geschichte/Blumenkaiser_Franz

Dissertação de Mestrado, Estudos de Arqueologia Forense Aplicados aos Remanescentes Humanos dos Primeiros Imperadores do Brasil Depositados no Monumento à Independência. Valdirene do Carmo Amiel. Universidade de São Paulo, Museu de Arqueologia e Etnologia, Programa de Pós-Graduação em Arqueologia. Disponível em: https://teses.usp.br/teses/disponiveis/71/71131/tde-27032013-173516/publico/VALDIRENE_Dissertacao_Revisada.pdf

José Bonifácio, o pai da mineralogia no Brasil. Museu de Minerais, Minérios e Rochas Heinz Ebert. Matéria de Isabella de Oliveira Franco. Disponível em: https://museuhe.com.br/2018/04/06/jose-bonifacio-o-pai-da-mineralogia-no-brasil/

D. Leopoldina: A história não contada. A mulher que arquitetou a Independência do Brasil. Autor: Paulo Rezzutti. Editora: LeYa.

Dona Leopoldina: uma Habsburgo no trono brasileiro. Autora: Gloria Kaiser. Editora: Nova Fronteira.

Professora Sabrina Ribeiro

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